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quinta-feira, 16 de janeiro de 2014

Padecendo no paraíso, mas sem perder a ternura

Hay que endurecer-se, pero sin perder la ternura jamás!
Ernesto Che Guevara

Ser mãe é padecer no paraíso. Agora vai mudar tudo. Você nunca mais será a mesma. O casamento muda. Você não será mais prioridade. Você só viverá para seu filho. Criança só é bom no colo dos outros... Enfim, a lista de frases clichês é imensa. Quando você se anuncia grávida, te falam todo o tipo de coisa, das mais lindas às mais desagradáveis. E, você, ali, tão grávida, tão cheia de si, tão contente, tão realizando um sonho e algumas pessoas te falando, incansavelmente, que tudo vai mudar e que a sua vida vai virar uma m...
Dependendo da pessoa, inclusive, dá para perceber o sorrisinho de sarcasmo no canto da boca e você parece ser capaz de escutar o comentário maldoso por trás daquilo “agora, você vai ver...”.

Tem muita gente legal que te diz coisas lindas, que quer te encher de conselhos e fala empolgada sobre ser mãe. Mas tem muita gente do tipo “tia chata” que adora falar do sofrimento que é ser mãe. Parece que aquilo funciona como uma espécie de vingança pessoal: agora ela vai ver o que é bom e vai passar por tudo que eu passei.... Bom, eu de minha parte, estou gostando muito de ser mãe. Tudo mudou? Inegavelmente!!!! Pense em sua vida sossegada e descompromissada de outrora... realmente, ela não existe mais e não sei se um dia voltará a existir. Talvez em um futuro muito distante.

Coisas simples já não são mais tão simples. Sair de casa, por exemplo, envolve uma operação logística que abrange desde fraldas e (muitas) roupinhas (para frio e calor), passa por frutas e comidinhas extras terminando em antitérmico e termômetro (nunca se sabe, né?!).

Mas esse texto não quer falar só sobre isso. Não quero falar do tema mudanças. Quero falar de um assunto que também é clichê, mas que é muito mais agradável: a recompensa. Quero falar do lado bom. Para tanto, não vou filosofar e falar das “maravilhas” de padecer no paraíso e blá blá blá. Quero falar sobre algumas coisas concretas.

Primeiro, não quero falar da maternidade, pelo menos, não da minha, mas a da minha mãe. Ou seja, quero falar do ponto de vista de FILHA. Do fundo do coração, como gosto de ser filha da minha mãe. Desde criança, eu a via linda e tinha/tenho o maior orgulho dela. Eu não entendia nada de moda ou etiqueta, mas achava lindo o modo como ela se vestia, como ela falava, como ela era. Eu queria ser como a minha mãe. Ela foi, durante toda a minha infância, o meu modelo. Tenho lembranças lindas do carinho dela, do amor, do aconchego que eu sentia. Entre nós, aqui em casa, tem uma expressão que já é conhecida: “cheiro macio”. Foi assim que, depois de grande, eu passei a descrever o cheirinho da minha mãe! Ela sempre foi cheirosa. E um cheirinho só dela. Um cheiro que, de verdade, parece que é macio de tão gostoso.

Se fosse para contar, seriam um milhão de histórias. E não é só coisa de “mãe, eu te amo”. Não, tem muita revolta adolescente, muita bronca homérica, muita discussão. Mas, essa é uma coisa que eu aprendi, porque sempre era assim: minha mãe falava, eu questionava, ela falava e explicava os motivos de modo muito esclarecedor e enfático (geralmente, não era assim tão lindo, é que contando fica bonito, mas era uma queda de braço). Na hora, eu pensava que era besteira, nada a ver, minha mãe não sabe de nada, ela não entende nada, ela já é ultrapassada, não entende o mundo, ela pensa que é perfeita e por aí ía... até que o tempo (grande amigo) passava, a coisa se assentava, eu olhava outras pessoas, escutava outras histórias e acabava dando razão para minha mãe. Hoje, ainda recorro a ela quando preciso de conselhos. “O que a mãe acha?” Essa é uma frase recorrente.

Bem, porque estou falando sobre isso? Porque hoje sou mãe e vejo como essa tarefa é difícil (e olha que a minha filha tem um pouco mais de um ano somente). Sinto na pele como temos dúvidas, medos, angústias. Como desejamos a felicidade e o bem estar de um filho. Como dói ter um filho. E não estou falando de uma dor física, é uma dor diferente de todas. É a dor pela vida de alguém. Você quer que tudo dê certo, você quer cuida-la de todos os lados, você não quer que ela sofra, mas, ao mesmo tempo, você não pode esquecer que ela é uma pessoa, que como eu, é independente e precisa ser capaz de aguentar a vida como ela é. Isso significa que o seu filho vai sofrer, vai entristecer, vai desejar coisas que não pode ter, vai te odiar, às vezes, e outras vai te amar pra sempre e, em outras ocasiões, vai esquecer que você existe. Realmente, ser mãe, entre outras coisas, “é padecer no paraíso”.

A natureza é sábia quando nos fez primeiro filhos para, depois, ser pais. Sendo pais, vemos nossos progenitores de outro modo. E, muitas vezes, sem nos dar conta, os repetimos, somos sua versão e, um belo dia, os vemos em nós mesmos. Para quem gosta de reparar na vida, a maternidade é um doce convite à reflexão.

Enfim, não queria partir para o lado filosófico, como disse, mas a conversa tomou esse rumo poético e um pouco melancólico. Mas, mudemos de ares. Porque comecei falando disso? Porque essa coisa de padecer no paraíso um dia desses se materializou para mim do modo mais clichê e estereotipado que se possa imaginar (mas, mesmo sem a originalidade esperada, foi muito lindo e gostoso).

Faz um tempo, de madrugada, tudo quietinho, eu, Alice e marido dormindo juntos, nessa ordem, na cama. Até que acordei com umas cutucadinhas, abri os olhos e minha linda filha estava me olhando e, quando viu que eu me acordei, abriu um sorrisão como se dissesse: “oi mãe, tô aqui!” e fez o que sempre faz, procurou o mamazinho. Mamou e, como sempre, dormiu capotada para o lado. É quase sempre isso: mama, vira para o lado e dorme com cara de quem acabou de comer uma feijoada e foi deitar pra relaxar. Sabe aquela cara de sábado depois do almoço, vou tirar uma sonequinha? Então, foi assim.

O mais bonitinho foi ela, no alto dos seus doze meses (na época) ter acordado quietinha, ter me acordado e ter me olhado com aquela carinha: será que rola um leitinho, mãe? Gente, aquilo foi mais ou menos padecer no paraíso, porque, cansada, de madrugada, no melhor do sono, ufffffPiscar, mas com aquela carinha, aquele olhar, ohhhhhhUau!. Valeu a pena!!!!!

Fecho o texto, então, com essa ideia. Entre outras coisas, padecer no paraíso, para mim, tem sido isso. Tenho feito coisas que, antes de ter filhos, me pareceriam um sofrimento impossível de suportar, mas, agora, vejo que, até nas “piores” coisas, tem algo de muito bom. Algo que só quem é mãe sabe (outro clichê, mas é verdade). Por isso, aí vai um recadinho para aquelas pessoas do tipo “tia chata”: oi, sou mãe também e estou aqui feliz da vida, cheia de histórias legais pra contar, com minha filha a tira colo. Conversa de mãe. Quer entrar na roda!!!!

Imagina a cara de desgosto!!!!! Tem vingança melhor do que essa??? Não precisa nem fazer cara de sarcasmo rsrsrsr.
Tranquilo
Beijinhos.

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