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sábado, 9 de agosto de 2014

Tempo: quantidade ou qualidade?

Quando a Alice tinha oito meses eu comecei a trabalhar o dia todo. Saía de casa às 8, vinha almoçar, ficava uma hora com ela e voltava para casa lá pelas 18:30. Vivi essa rotina durante longos oito meses. Era muito difícil para mim, principalmente, porque eu sentia que estava deixando de viver plenamente o crescimento e o desenvolvimento da minha filha.
Essa sensação acabava comigo, já contei como eu sentia muita culpa e como eu tentava aproveitar, ao máximo, o tempo que podia passar com ela. Isso significa que eu dormia super pouco, comia super mal e não fazia nada além de trabalhar e ficar com a minha filha.

Graças ao bom Deus, depois de eu tanto pedir, acendeu-se não só uma luz, mas um refletor. Passei em um concurso público. Além de realizar um sonho, aquilo significaria poder passar o dia todo com minha filha. Sou professora e dou aula à noite. Uma parte do meu trabalho posso fazer em casa, enquanto a Alice dorme. Essa incrível transformação vem me proporcionando o que eu mais queria: brincar com a minha filha, fazer a comida dela, acordar com ela todo dia de manhã, faze-la dormir depois do almoço,... enfim... ESTAR COM ELA.

Quando vc escuta que, para os filhos, o importante é a qualidade do tempo que passamos com eles e não somente a quantidade, a coisa parece ter sentido. Mas, para mim, venho percebendo que a quantidade de tempo é tão importante quanto a qualidade. É muito diferente quando vc assume totalmente a função de CUIDAR. Ou seja, cozinhar, vestir, limpar, dar banho, trocar as fraldas. Todas essas pequenas ações vc só consegue viver durante a rotina do dia a dia. Passar o dia todo, ou uma parte significativa dele com a criança, é muito diferente do que encontrar a criança às 7 da noite já alimentada, de banho tomado e colocá-la para dormir às 7:30.

Mas claro que essa escolha tem o seu lado negro: é muito chato assumir todas essas tarefas, todo dia, sem folga... É maravilhoso poder estar em casa com a minha filha, mas tem dias que eu me sinto extremamente cansada, exausta, de saco cheio, querendo fugir.

Nessas horas, eu me lembro de como era trabalhar fora: levantar, me arrumar, pentear o cabelo e ir trabalhar e deixar todo o trabalho duro para minha mãe, que ficava com a Alice. No meu trabalho, eu pensava em como era horrível me afastar daquela maneira da minha filha, sofria horrores, mas, ao mesmo tempo, conversava com outras pessoas, tomava um cafezinho tranquila, colocava meus emails em dia, lia coisas interessantes, pensava no meu doutorado e por aí vai... Hoje, eu acordo e nem me olho no espelho, tem dias que só vou tirar o pijama antes de ir trabalhar à noite. A Alice me chama tanto durante o dia que, às vezes, parece que tem um zumbido constante no meu ouvido... Mas, apesar de todo esse caos, quero continuar assim, porque sei que minha filha precisa de mim com ela. Ela precisa que eu cuide dela. É esse cuidado constante que fortalece nosso vínculo.

Um dia me disseram: não vale a pena ficar em casa cuidando de filho, pois eles crescem e vão embora. Pois é, mas tenho cá pra mim que ser mãe é isso mesmo, é se sacrificar muito sem esperar qualquer benefício em troca. Ou seja, vc é capaz de deixar a vida social de lado, postergar a carreira profissional, suspender projetos... tudo isso porque VOCÊ quis ser mãe/pai. Esta é uma escolha sua, por isso não dá pra se queixar, se não quiser passar por isso, ESCOLHA não ter filhos.

Entendo perfeitamente que não dá pra parar a vida, afinal todos precisamos de dinheiro para viver. Seria muito bom poder ter uma licença maternidade maior, o que propiciaria à mãe passar mais tempo com seu filho sem precisar preocupar-se com o dinheiro. Infelizmente, essa não é nossa realidade. Por esse motivo, antes de pensar em colocar uma pessoinha no mundo, vale a pena se perguntar: como vou cuidar do meu filho? Vou dar conta? Consigo trabalhar menos ou, quem sabe, parar de trabalhar? E, acima de tudo: Estou a fim de fazer isso ou só estou cumprindo mais um requisito social para a "felicidade" (estudar, ter um bom emprego, casar e ter filhos)?

Sem querer julgar ninguém, nem pousar de "mãe perfeita", mas acho que todos os pais precisam urgentemente fazer a seguinte reflexão: quem está criando meu filho? Será que passar uma hora por dia com ele (estou sendo otimista, sei que muita gente não consegue nem isso) significa que ele tem o bastante de mim? Uma vez ouvi, em um consultório, uma moça falando mal de sua mãe: ela não cuidava bem de sua filha, enquanto a moça precisava trabalhar. Segundo a tal moça, a avó não sabia educar porque não colocava limites na criança. Então cabe a pergunta: porque vc não passa o dia com o seu filho e lhe impõe limites? Me desculpe, mas essa tarefa é sua. É muito fácil dizer como fazer se não é vc, efetivamente, que faz. Trata-se da velha história: prática X teoria.

Mais uma vez, não quero julgar ninguém e sei que cada um tem a sua realidade e as suas dificuldades, mas se vc ESCOLHEU ter filhos, assuma-os com toda a chatice e saco cheio que eles provocam.

Filhos, meus amigos, são maravilhosos, mas ao mesmo tempo podem ser terríveis: eles choram, gritam, fazem birras, falam sem parar, não querem comer, desobedecem... Vc precisa acordar cedo, às vezes, nem dormir, levar ao médico, dar vacina, aprender a cozinhar, trocar fraldas ultrafedorentas... vichi tanta coisa ruim, chata... e daí, às vezes, vc pára e tenta se lembrar de como era antes, de quem vc era antes e, então, no meio da sua reflexão, vem o cidadãozinho e te chama: "mãe, queio colo". Acabou a reflexão, vc acorda pra vida real e vê que tudo mudou. Algumas coisas mudaram para melhor, outras nem tanto, vc possivelmente, já não é mais a mesma pessoa desde quando entrou nesse barco, pois, definitivamente, algo mudou de foco: vc e as suas necessidade deixaram de ocupar o lugar principal, existe alguém muito mais importante que te exige o tempo todo e é assim que tem que ser.

Por tudo isso, se vc tem filhos, dedique a eles o máximo de tempo e de coração possível e não acredite que a qualidade é mais importante do que a quantidade de tempo. Isso, para mim, foi uma coisa inventada para diminuir a culpa das mães. Tanto a quantidade quanto a qualidade de tempo são fundamentais na criação de um filho, que precisa de muito mais do que alguns minutos diários de atenção. 

Muito mais importante do que a marca das fraldas, do que as roupas, berço, cadeirão, bebê conforto, chiqueirinho, brinquedos, educação de qualidade, programas educativos, filhos precisam de amor e amor demanda dedicação, abdicação, escolhas e, sobretudo, tempo disponível e PRE-SEN-ÇA!!!!!



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